Será que ainda te lembras da primeira fanzine que leste? Daquela antes de todas as outras e antes de tudo o mais? Eu lembro-me da minha primeira vez...
A primeira vez que tive as minhas mãos, os meus olhos e a minha mente tiveram contacto com uma publicação do género, uma vulgar fanzine, foi durante o ano de 1993. Através de artes mágicas e outras artimanhas semelhantes, o segundo número de uma fanzine brasileira chegou à minha posse. O seu nome era Resíduo Suburbano e era de uma simplicidade refrescante. Em 8 páginas fotocopiadas e com uma apresentação que de profissional não tinha absolutamente nada, baseada sobretudo em colagens, escrevia-se acerca de bandas, faziam-se algumas referências críticas acerca da sociedade em geral e ainda se tentava divulgar outros projectos do mesmo tipo. Aquilo era bestial, principalmente por ter sido feito por uma pessoa tal e qual como eu, que gostava do mesmo tipo de música e cujas opiniões convergiam no mesmo sentido.
O meu interesse, a partir daquele momento, começou a aumentar à medida dos dias que passavam. Aquilo era simples e poderia muito bem servir como veículo para as minhas ideias, para os meus interesses e opiniões. A única coisa que precisava descobrir era como criar algo que fosse semelhante, mas meu. E dpois disso, como dar aquilo a conhecer a todos os outros? Senti que precisava de reunir o máximo de informação acerca desse meio que estava agora a desvendar-se para mim...

Mas não foi apenas do Brasil que a luz me atingiu. Por essa altura, o jornal Blitz publicava semanalmente num pequeno espaço chamado “Arame Farpado” (da responsabilidade de António Freitas), alguns contactos de fanzines, newsletters, bandas, distribuidoras, editoras e tudo o mais que possam imaginar. Também através desse espaço o meu espectro de contactos se foi alargando e mais coisas e pessoas do mundo underground acabei por conhecer, quer fosse ele metaleiro ou punkarra! Muitas cartas eram escritas e recebidas e praticamente tudo era feito através do serviço postal dos correios, porque a internet ainda era uma forasteira nas nossas casas.
Através desses contactos, desses cartas, uns houve que me ajudaram bastante no meu crescimento e no meu conhecimento de como as coisas se processavam. Entre eles, não esqueço aquele que foi o meu primeiro contacto com uma banda do underground punk/hardcore, na pessoa do seu baterista Rui Maia, dos já desaparecidos INKISIÇÃO, que não só respondeu às perguntas que lhe enviei na primeira entrevista que fiz, como ainda me forneceu muitos contactos de outras pessoas e outras bandas que me aconselhou a contactar, para além de ao longo do tempo me ter também dado a conhecer algum som de muita qualidade. Muito obrigado, Rui!
A referida entrevista com Inkisição (com perguntas muito básicas, próprias de um novato) viria a figurar no primeiro número da fanzine Atitude Alternativa, projecto criado juntamente com o amigo Carlos, depois de já ter feito uma experiência com o nome Escarro Social. Entre outras matérias, saíram neste primeiro número da Atitude Alternativa, entrevistas com Simbiose, Alcoore, Foragidos da Placenta e Slime Records, que hoje em dia é conhecida como Ataque Sonoro. Tudo isto ainda durante o início de 1994...
Daqui para a frente as coisas tomaram os rumos que deveriam tomar. Projectos nasceram e morreram, uns com grande facilidade outros nem tanto. O mundo das zines na realidade portuguesa passou por diversas fases, algumas ricas em diversidade e conteúdos, outras mais fracas, mas sempre em estado de gestação de outros projectos. Com o advento e facilidade de acesso a informação fornecido pela internet, as zines em papel começaram a diminuir dando lugar às e-zines em geral. Mas o mundo continua a girar e as coisas continuam a acontecer.
Em resumo, devo muito do que conheci e aprendi ao longo destes anos àquelas 8 páginas fotocopiadas que vieram parar às minhas mãos. Sem elas, talvez não teria sido atraído para este mundo, nem teria feito muito do que fiz ou dito muito do que disse. Não teria feito as amizades que fiz e disfrutado dos momentos que me foram proporcionados. Mesmo apesar de todos os períodos de desilusão e de menor criatividade e sagacidade. Aquela fanzine foi importante para que passasse por tudo isso. Tudo está bem quando corre bem...
(Rui Marujo)
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